Pauta cujo teor complexo rende debates de igual dimensão, a reforma tributária gerou várias argumentações da classe produtiva durante a sexta-feira (17/5), no Centro da Indústria, Comércio e Serviços (CIC-BG), onde a Frente Parlamentar Mista sobre o tema realizou a primeira das únicas duas audiências públicas que ocorrerão no interior do Estado.
Os encontros, geralmente nas capitais, fazem parte do trabalho para levantar sugestões de empresários, de produtores, de consumidores e da sociedade para elaborar uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC).
A ideia da comissão, segundo o deputado Ronaldo Santini (PTB-RS), um dos 300 parlamentares que assinaram sua criação e integrante integrante da Frente comandada pelo deputado Luis Miranda (DEM-DF), é baixar a tributação do consumo e aumentar a tributação sobre a renda. “No nosso entendimento, deveria ser prioridade, porque já estaríamos num estágio de crescimento e desenvolvimento, barateando o custo de nossa produção, gerando emprego e renda, além de o brasileiro confiando nas nossas instituições”, disse.
A ideia de que a reforma alavancaria o desenvolvimento da nação está ancorada em estudos produzidos nos últimos dois anos pela Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (ANFIP) e pela Federação Nacional do Fisco Estadual e Distrital (Fenafisco), parceiros da Frente. Um dos palestrantes da noite, o vice-presidente de Estudos e Assuntos Tributários da ANFIP, Cesar Roxo Machado, disse que 10% dos mais ricos (quem ganha mais do que R$ 5.214) do Brasil ficam com mais de 50% de tudo que é produzido no país. Para ele, é preciso um sistema tributário justo, com cada contribuinte sendo tributado de acordo com sua capacidade contributiva. “Quanto mais progressivos forem os sistemas tributário menos concentrador de renda serão, e a sociedade fica com maior poder de consumo e alavanca a economia”, explicou.
De acordo com ele, o sistema tributário trava o desenvolvimento porque 50% da carga tributária incide sobre o consumo, enquanto em países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) – formado por 36 nações que produzem mais da metade da riqueza do mundo – a média é de 34%. Enquanto no Brasil a tributação da renda é de 18%, nesses países fica em 34% – sobre o patrimônio, ao passo que aqui fica em 4%, lá fica em 6%.
Também na comparação com os países da OCDE, a carga brasileira, de 32,3%, é menor do que a média desses países, que é de 34,3%. “Não é que seja baixa, mas não é a mais alta. O problema não é tanto o tamanho da carga tributária, o problema é que tem que reestruturá-la, reduzir sobre o consumo e compensar na renda e no patrimônio”, ponderou Machado. Para ele, é preciso saber que tipo de país as pessoas querem, porque a carga tributária vai financiar as políticas públicas e tem o poder tanto de aumentar ou de diminuir as desigualdades.
Para que o PIB aumente, a fim de trazer desenvolvimento ao país, é necessário mexer na alíquota do imposto de renda. Hoje, quem ganha a partir de cinco salários mínimos já entra na alíquota máxima, de 27,5%. A Frente quer isentar quem ganha até quatro salários mínimos – uma massa de 10,6 milhões de trabalhadores – e desonerar quem ganha entre quatro e 15 salários mínimos – 13,4 milhões de trabalhadores -, com alíquotas progressivas de 7,5%, 15% e 22,5%. Os que ganham entre 15 e 40 salários permaneceriam na faixa dos 27,5%. Já os com rendimento entre 40 e 60 salários seriam onerados em 35%, e os que ganham a partir de 60 salários em 40%.
Hoje, no Congresso Nacional, há basicamente outros dois textos sobre reforma tributária. Um do deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), que acaba com os tributos como IPI, ICMS e ISS – no total são 10 – e cria um imposto sobre o valor agregado de competência estadual, chamado de Imposto sobre Operações com Bens e Serviços (IBS), e um imposto sobre bens e serviços específicos (Imposto Seletivo), de competência federal. O outro texto, do deputado Baleia Rossi (MDB-SP), prevê a criação de uma alíquota única sobre o consumo e a simplificação radical do sistema tributário brasileiro. Para Machado, há qualidade em ambos, mas ele discorda de alguns pontos. “A vantagem é a simplificação grande, mas nós da Anfip achamos que não reduz a carga tributária, não ataca o problema”, disse Machado.
Para o auditor fiscal da Receita Estadual Christian Jesus Silva de Azevedo, também diretor de Comunicação e Integração Social do Sindicato dos Servidores Públicos da Administração Tributária do Estado do Rio Grande do Sul (Sindifisco-RS), disse que é a reforma tributária precisa ser solidária. “Quando houve a prorrogação da alíquota elevada do ICMS, a classe empresarial foi solidária, não era o que todos queriam, mas houve consenso. A solidariedade será princípio básico da reforma, todos precisam ser solidários, pois há uma grande distorção que penaliza os mais pobres”, comentou Azevedo, que representou no ato a Fenafisco.
A simplificação do sistema tributário do país também é uma das reivindicações. Hoje, há no Brasil mais de 60 tributos e 95 obrigações acessórias, além de uma média de 33 normas tributárias editadas diariamente. Entre os números apresentados pelos contadores Antônio Carlos Paludo e Marcos Fracalossi, desde a Constituição de 1988 já foram editadas cerca de 250 mil normas tributárias. Só o ICMS tem 27 regulamentos, e há 5.579 códigos tributários municipais no Brasil.
Para Gialdi, país chegou ao limite
O presidente do CIC-BG, Elton Paulo Gialdi, disse que o país chegou ao limite com a oneração que tanto a classe empresarial quanto a sociedade vem sofrendo há anos.
Para ele, é impreterível que a reforma tributária entre na pauta da Câmara dos Deputados, porque ela é essencial para fazer o país voltar a crescer. “Nosso sistema tributário é burro, trabalha contra o desenvolvimento e desestimula a economia, pois onera a produção e diminui o poder de compra do trabalhador, causando uma desaceleração no consumo, tão importante para o aquecimento da produção industrial e geração de empregos”, disse o dirigente.
Gialdi também afirmou que a crise econômica teria fim caso pequenas e médias empresas pagassem apenas 50% dos valores destinados aos impostos. “Imagina o que poderia ser feito com os outros 50%? Acabaria crise, porque nós iriamos reinvestir este valor, movimentar a economia local, pagar melhores salários, comprar e investir”, opinou.
O empresário ainda defende uma regulamentação para desburocratizar o complexo sistema tributário brasileiro, já que normas são editadas a todo momento, encarecendo o serviço e complicado a situação do contribuinte. “Não se trata apenas de redução de impostos, mas de regras mais claras e práticas”, salientou, dizendo que percebe boa vontade política neste governo para desburocratizar os processos que ajudam a emperrar o desenvolvimento do país. “A sociedade está sendo mais ouvida por aqueles que podem efetivamente fazer mudanças, a classe política”.
Segundo o prefeito de Bento Gonçalves, Guilherme Pasin, o Brasil precisa discutir o país que quer ser. “Queremos ser um país que tributa mais e entrega serviços bons ou que tributa menos e não oferece serviços como os previstos na Constituição? Não escutei esses questionamentos”, comentou o também presidente da Associação dos Municípios da Encosta Superior do Nordeste (Amesne). “É preciso reduzir impostos com qualidade, e não apenas reduzir, porque alguém tem que cuidar daquele que precisa”, prosseguiu.
Edson Morello, presidente da Associação das Entidades Representativas de Classe Empresária Gaúcha (CICS Serra), disse que a carga tributária paga pela sociedade precisa ter uma solução, principalmente no retorno que os governos oferecem aos cidadãos. “Ninguém pede que não se pague imposto, isso não existe. O que muda é o que volta para quem paga e, no momento, o que recebemos de volta é que um dia a coisa via mudar”, disse.
Fonte: CIC