O debate sobre “A tributação do consumo e seus efeitos na desigualdade da renda” abriu, nesta quinta-feira (21/10), o segundo dia do Fórum Internacional Tributário – FIT 2021, promovido pela ANFIP e pela Fenafisco. O evento, que acontece presencialmente em São Paulo, também está com transmissão virtual e as inscrições ainda podem ser feitas para acesso às salas de reunião. Acesse aqui.
O debate teve coordenação de Marlúcia Ferreira Paixão, vice-presidente da Fenafisco, e, como debatedora, Débora Freire, professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
O professor Juan Pablo Jimenez, da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais – FLACSO (Buenos Aires), falou sobre os impactos da pandemia na América Latina, destacando a queda do nível das atividades, sendo necessário financiamento público, cooperação entre os países e mudanças nos sistemas tributários para torná-los mais justos e eficientes.
Dentre as mudanças necessárias, para fazer frente a esses desafios, Jimenez considera importantes o imposto sobre pessoa física, promovendo equidade o sistema; tributação da renda e da propriedade; e aumento da carga tributária para financiar as políticas públicas prestadas pelo Estado.
Sobre a política fiscal, o professor Jimenez destacou três principais funções: distribuição de renda, arrecadação e gasto público. “É importante olhar não apenas quanto se arrecada, mas o gasto público. O gasto público como o instrumento mais poderoso a longo prazo”, avaliou.
Ele também ressaltou que os dados sobre a desigualdade na América Latina mostram por si só a necessidade de uma política de redistribuição de renda e defendeu o sistema progressivo de impostos, que “pode contribuir com a redução dessa desigualdade”. “As reformas não podem ser uma tarefa fácil e rápida, para garantir que sejam a longo prazo”, alertou, destacando que é necessário construir consensos entre os governos.
Nestor Castaneda, professor de Economia da University College of London – UCL (Reino Unido), apresentou argumentos da economia política para descrever os problemas e desafios tributários enfrentados, especialmente na Colômbia, e a importância da mobilização dos atores políticos para implementar transformações estruturais no sistema tributário que reduza as desigualdades. Para Castaneda, é importante encontrar ferramentas que possam fazer uma política tributária mais eficiente. Porém, explicou, essas reformas estruturais, especialmente as progressivas, são difíceis de implantar na América Latina. Segundo o professor, algumas explicações para isso passam pela relação entre empresariado e governo. “Temos que ter a ideia de que empresários e estados devem encontrar caminhos para implantar reformas sociais públicas”, acredita. Quanto mais fragmentada essa relação, mais difícil implantar reformas; por outro lado, afirmou Castaneda, quando o empresariado está coordenado e o governo impondo autoridade, a distribuição dos impostos vai acontecer.
Na Colômbia, Castaneda informou que reformas tributárias são bem sucedidas. Porém, os governos fazem apenas minirreformas, mudanças que buscam corrigir questões fiscais de curto prazo. “Não são estruturais, são por curto prazo, não têm nenhum tipo de efeito significativo na arrecadação. O nível de eficiência é baixo”, disse. Ainda assim, as receitas tributárias registraram evolução desde 1990, em comparação com os países da América Latina, o que a levou a estar na média da região. Mesmo com esse resultado, o peso da tributação sobre a renda é baixo, que gera efeito regressivo na distribuição das receitas. O país ainda depende dos impostos indiretos. Com relação à desigualdade, Castaneda relatou que ela permanece constante nos últimos 20 anos.
Fernando Peláez, do Centro Interamericano de Administraciones Tributarias (CIAT), esclareceu questões relacionadas aos gastos tributários na América Latina e da necessidade de se discutir as receitas e a importância do gasto tributário em cada país. Segundo explicou, falta harmonizar os critérios dos gastos tributários, já que os países têm diferentes conceitos, alcances e coberturas. “O que é gasto efetivo, quais aqueles que têm mais força?”, disse.
O professor Peláez também ressaltou que os gastos tributários dos países da AL estão mais concentrados em impostos gerais do consumo. No caso dos países que adotam o IVA (imposto sobre valor agregado), há isenção de taxas reduzidas em produtos de serviços de saúde, educação, medicamentos, dentre outros.
No entanto, apesar de reduzir a regressividade do imposto sobre bens de consumo, o IVA não tem se mostrado eficiente, de acordo com o especialista. “Estudos mostram sua (leve) capacidade de reduzir a incidência e depois a regressão, mas com custo fiscal excessivo”, observou. Como solução, propõe que as exceções sejam focadas em pessoas e não em produtos. “Certos incentivos setoriais que afetam o consumo e a distribuição de renda também são regressivos. E geram perdas de cobrança significativas”, acrescentou. Para ele, as reformas tributárias dos países da AL precisam promover mudanças na tributação sobre o consumo, visando a progressividade e, consequentemente, reduzir a desigualdade de renda.
Débora Freire, professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), debatedora do painel, destacou a convergência dos problemas na América Latina, os quais o Brasil também apresenta de forma intensa. A coordenação dos atores políticos e empresariais, assim como na Colômbia, é um grande problema para o avanço de reformas estruturais no Brasil. “Toda proposta de reforma é difícil de ser levada em frente. Propostas progressivas têm muita dificuldade de avançar por essa falta de coordenação”, enfatizou. Assim como o Uruguai, o Brasil também apresenta elevado gasto tributário, priorizando, segundo a professora, setores e não pessoas. Com relação à Argentina, o Brasil também precisa intensificar a discussão sobre implementar impostos sobre a riqueza e melhorar a amplitude de impostos sobre herança e patrimônio.
Para a professora, é preciso de uma reforma que atue sobre o imposto de renda e trate da tributação sobre patrimônio e herança; assim como é preciso discutir a melhora na tributação sobre consumo, por meio de IVA mais eficiente. “Equilibrar o sistema, de forma que não traga cumulatividade, proporciona redução de custos”, avaliou. Freire concluiu que o caminho é colocar a sociedade para pensar, debater e gerar consciência de que a desigualdade é ruim do ponto de vista humano e econômico. “Uma sociedade menos desigual é uma sociedade mais produtiva”, finalizou.
O FIT é uma iniciativa da ANFIP e da Fenafisco (Federação do Fisco Estadual e Distrital) e Sinafresp (Sindicato dos Agentes Fiscais de Rendas do Estado de São Paulo), com apoio da Oxfam Brasil e da Internacional de Serviços Públicos (ISP). O evento acontece até sexta-feira (22/10). Para mais detalhes sobre a programação e os palestrantes, acesse o site www.forumfit.org.br e siga o evento nas redes Instagram, Facebook, Twitter, LinkedIn e YouTube.